Uma das situações comuns entre familiares de crianças autistas é a demora do diagnóstico e a "peregrinação" a diferentes profissionais de saúde na busca de respostas às alterações de comportamento que a criança pode apresentar após o primeiro ano de vida. A acadêmica do curso de Pedagogia da Aupex/Uniasselvi da turma PED 1495 Juliane dos Santos passou por essa situação antes de descobrir que seu filho, Eduardo dos Santos, hoje com seis anos, possuía a síndrome do Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), ou simplesmente, o Autismo. Ela buscou ajuda médica aos 18 meses de vida de Eduardo em função da ausência de fala e ao notar também que o comportamento do filho era diferente em relação às crianças de mesma idade.
O desconhecimento das características do TEA em geral atrasa o diagnóstico, que é clínico, feito através de observação direta do comportamento e de uma entrevista com os pais ou responsáveis. Os sintomas costumam estar presentes antes dos três anos de idade, sendo possível sua confirmação já por volta dos 18 meses. A síndrome é classificado em três graus atualmente: leve, moderado e severo.
Crianças com TEA começam a demonstrar sinais nos primeiros meses de vida: elas não mantêm contato visual efetivo e não olham quando você chama. A partir dos 12 meses, por exemplo, elas também não apontam com o dedinho. No primeiro ano de vida, demonstram mais interesse nos objetos do que nas pessoas e, quando os pais fazem brincadeiras de esconder, sorrir, podem não demonstrar muita reação.
Apesar de os sinais do transtorno variarem, há três comprometimentos que são considerados mais comuns: na interação social, ou seja, no modo de se relacionar com outras crianças, com adultos ou com o meio ambiente; na comunicação: há crianças que não desenvolvem a fala e outras que têm ecolalia (fala repetitiva); e, por último, há a questão comportamental em que as ações podem ser estereotipadas, repetitivas. Por estes motivos, Juliane luta pela divulgação sobre o Autismo, que tem em 2 de abril a celebração mundial pela sua Conscientização.
A intervenção para tratamento deve ser feita o mais rápido possível para as crianças após o diagnóstico. Estudo recente diz que, quando se trabalha com crianças de 3 anos, a melhora chega a 80%, mas quando tratamos de pacientes com menos de 3 anos, pode alcançar 90%. Ao conseguir fazer o diagnóstico com 1 ano e 6 meses e intervir em linguagem e comportamento com pais participativos, a probabilidade é de que a criança saia de um grupo severo para um médio, e do médio para o leve.
A acadêmica explica que o tratamento para esta síndrome demanda uma rotina diária intensa. Buscamos nesta entrevista com Juliane saber como é a rotina e a luta dos familiares que buscam o melhor tratamento para essas pessoas.
1 – De que forma você e seu marido confirmaram que seu filho Eduardo era autista?
Procuramos o pediatra seguido do neuropediatra aos 18 meses do “Dudu” (apelido da criança). A princípio parecia apenas um atraso de desenvolvimento. Ele foi encaminhado para uma fonoaudióloga e ingressou em um CEI para a socialização, permanecendo em análise por seis meses. Após este período, ele começou o processo de descobertas e passou a apresentar momentos de desespero, seguido por crises de choro, birra. Eu tinha total desconhecimento sobre o que seria o Autismo.
Por mais de um ano fizemos um tour desgastante a consultórios médicos, exames direcionados ao cérebro, de sangue, de ouvido, e as hipóteses de outro problema de saúde iam sendo descartados um a um. Até que finalmente conhecemos uma pediatra do desenvolvimento e fomos encaminhados à AMA- Associação de Amigos do Autista, que realizou uma avaliação minuciosa e nos informou sobre o diagnóstico de Autismo. O que eu senti não saberia explicar em palavras. Talvez uma mistura de alívio por encerrar a busca pelo desconhecido e, também, desespero de não entender o que meu filho tinha.
2 – Qual foi a sua reação ao obter o diagnóstico do seu filho?
Eu tranquilizei meu coração enquanto olhava para meu filho que estava completando três anos de idade, pensando que ele precisava muito de meus esforços. Falei para os técnicos ali presentes: “Ok! Autismo! E agora o que eu tenho que fazer?” Eles me orientaram e com a ajuda de nossa família seguimos em frente com todo o tratamento necessário, sendo que em poucos meses o Eduardo passou a ser atendido pela AMA Joinville, hoje referência em atendimentos aos autistas de toda região.
3 – Quais as dificuldades enfrentadas durante o início do tratamento?
A maior dificuldade para uma família de renda média baixa como a minha era custear as terapias freqüentes a um alto custo. A precariedade de especialistas nesta área é muito grande e os que têm experiência são super disputados. Os atendimentos do SUS são mínimos, para não falar que não existe, mas são praticamente nulos.
4 – Quais as dificuldades que vocês sentem ainda hoje?
Na época do diagnóstico eu não tinha muito entendimento sobre o assunto e precisei buscar conhecimento. Isso inclui a graduação de Pedagogia na Aupex/ Uniasselvi! Só não podia imaginar um preconceito alheio tão grande e a percepção de que o que é diferente dos padrões chama a atenção. Enfrentamos “o olhar torto”, cochichos e comentários de pessoas que julgam meu filho quando ele chora na fila de um mercado ou de um banco, ou por ter uma crise ao querer um objeto não disponível. A falta de conhecimento é uma das maiores fontes de preconceito. Uma das minhas lutas é repassar informações para que no futuro tenhamos um mundo melhor para todos os autistas.
5 – Como é a rotina de sua família?
Temos uma rotina bem puxada e sou eu quem o acompanha diariamente. O Dudu frequenta o primeiro ano do ensino regular no período vespertino e é acompanhado por uma auxiliar de educação. Em algumas manhãs ele é atendido na AMA, há outro dia que é acompanhado por uma psicóloga de análise do comportamento, e freqüenta também o Atendimento Educacional Especializado de sua escola. Na única manhã de folga que temos durante a semana, eu aplico as atividades que a psicóloga nos direciona para ajudá-lo aprender de uma maneira que ele consiga. Além dessa rotina diária ele faz acompanhamento com neuropediatra para administração de medicamento do qual ele usa assiduamente. O resultado é um menino mais contido, tranquilo, sem crises e distúrbios do sono.
6 – Como é o aprendizado na escola regular para ele?
As atividades de sala, na maioria das vezes, são adaptadas para ele que recebe o acompanhamento da professora do ensino especializado cujo objetivo é destacar suas potencialidades e aquilo que ele é capaz de aprender. Apesar de muitos empenhados, os professores da escola regular não estão preparados para receber estas crianças na escola, infelizmente! Eu como mãe, vejo que não posso deixar meu filho frequentar a escola apenas para passar o tempo. Por isso, sempre me proponho a ajudar e faço várias atividades para as professoras ajudá-lo.
7 – Quais as dificuldades que seu filho apresenta?
O Autismo é uma síndrome que afeta o neurodesenvolvimento da criança, ou seja, afeta as áreas da comunicação, socialização e a capacidade mental da imaginação, associados a movimentos estereotipados e distúrbios sensoriais. O Dudu tem como maior dificuldade a comunicação: aos seis anos ele não pronuncia nenhuma palavra. Em casa, muitas vezes, trabalhamos como adivinhos. Há alguns meses introduzimos um método de comunicação alternativa chamado PECS, que está nos surpreendendo devido a sua funcionalidade na comunicação. Trata-se de uma pasta de comunicação didática que virou a voz do Dudu e possibilitou a diminuição do sofrimento do nosso pequeno. Antes ele tinha crises de choro e irritação por que não entendíamos o que ele queria. Agora ele busca a comunicação com uma ficha desta pasta que indique sua vontade que eu o ajudo a construir com a orientação da psicóloga dele. Ele tem algumas dificuldades relacionadas ao autismo propriamente, mas de modo geral o Dudu é um menino tranquilo que superou vários obstáculos e sempre nos surpreende.
8 – O que precisa ser melhorado para que o autista possa acessar o melhor tratamento?
Há muito o que ser melhorado. É preciso um melhor atendimento oferecido pelo SUS para os autistas de nossa cidade. Temos uma AMA muito bem estruturada, porém sua fila de espera está em mais de 130 crianças, sendo que muitas destas famílias são de renda baixa e não tem qualquer condição de propiciar um atendimento particular para seus filhos.
Também precisamos melhorar a visão da sociedade em relação aos nossos autistas. O preconceito é evidente e fruto do puro desconhecimento. Percebo o carinho que as crianças tem para com meu filho e a intolerância não vem de seus companheiros de turma mas, sim, de seus próprios pais. Acredito que precisamos germinar o conhecimento e a semente do amor nas pessoas para que todos entendam que o Autismo é apenas uma condição diferente de viver neste mundo complicado.
9 – Qual a mensagem que você gostaria de destacar?
Minha luta em função do Autismo é constante e vejo a necessidade de incentivar e apoiar as novas mães que estão iniciando nessa batalha. Percebo que hoje sou uma pessoa muito melhor, capaz de perceber o outro e se colocar no problema de outra pessoa. Nenhuma mãe se prepara para ter um filho com deficiência, mas ele deve ser amado, cuidado e protegido como qualquer outra criança. Ele deve ter o direito de aprender, progredir e evoluir como um ser capaz. Ser diferente é normal e são as diferenças que dão o colorido à vida. Escolhi esta profissão de pedagoga para ser uma mãe mais capaz para meu filho e, assim, poder ajudá-lo no que for necessário e em tudo que tiver ao meu alcance. Durante um seminário sobre deficiência e inclusão que eu assistia, o palestrante apontou para mim e perguntou: “Se você pudesse voltar no tempo e escolher ter seu filho autista, você o teria? Eu respondi prontamente: Com toda certeza, sem meu filho eu não seria quem eu sou hoje, e se ele não fosse autista não seria o meu filho!”
Nesta sexta-feira, 6/4, a turma PED 1495 da tutora Dilcicleia de Barros, em que a aluna Juliane dos Santos estuda, irão promover uma ação de alusão à conscientização sobre o Autismo, que é celebrado neste dia 2 de abril mundialmente. Os acadêmicos irão soltar balões azuis no Polo da Aupex/Uniasselvi no período noturno e repassar informações sobre o Autismo a partir das 19h30.